Por Adauana Campos.
Vire e mexe sempre me deparo com pessoas que criticam os
militantes de internet. Mas com certa freqüência as feministas tem se tornado
um alvo em potencial dos críticos de internet. Por que feministas de internet
incomodam tanto? Por que suas militâncias, segundo os críticos, só passam de
chiliques digitais?
A internet, nos últimos 10 anos, tem se tornado uma grande
ferramenta de disseminação de informação e conhecimento. Movimentos sociais
ganharam adeptos e destaque, incluindo o feminismo.
Mas o que é o feminismo?
Feminismo é um movimento social, filosófico e político que
possui vertentes e teorias, mas que está em constante construção. Feministas
acreditam na equidade social, política e econômica entre os sexos. Mulheres
feministas tem consciência dos problemas específicos que acometem o seu gênero
e lutam para eliminar as barreiras e as descriminações a que estão sujeitas.
Feminismo é a resistência contra o machismo, não o contrário do mesmo.
Mas onde se encaixam as feministas de internet nesse
contexto do que é o feminismo?
A partir de agora vou mudar o feministas de internet para
mulheres que conhecerem o feminismo através da internet, pois vou mostrar para
vocês o porque de não existir “feminista
de internet”, e quando voltar e me referir a esse termo abstrato e imaterial
novamente, será em aspas, por motivos de: porque sim.
A mulher que conheceu o feminismo na internet está em
desconstrução. Todas nós quando nascemos somos metade vazias e metade fome.
Conforme crescemos nossos pais ou quem nos cria nos apresentam o mundo conforme
as suas crenças. Aprendemos sobre religião, comportamentos aceitáveis na
sociedade, receitas de bolo e somos socializados conforme o nosso sexo
biológico.
Pessoas nascidas com vagina são ensinadas a serem femininas, boas mães,
delicadas, amáveis, vaidosas, religiosas, prendadas, educadoras, castas, a amar
homens... Tudo é uma preparação para a vida adulta, onde a menina já ensinada a
ter o seu papel na cultura em que está inserida. Claro que há exceções que
fogem as regras, mas elas não representam mudanças na classe mulher, que ainda
é socializada e é ensinada a ser mulher.
Esse rito acontece a partir que se descobre no ultra som o sexo do bebê.
A mulher age de forma natural as mais diversas opressões,
como ser explorada em trabalhos domésticos e não remunerados, cuidar sozinha
dos filhos, renegar seus prazeres e desejos, ver outras mulheres como rivais e
inimigas, estar sempre se vigiando para ter uma postura aceitável, ser a
culpada pelas violências que sofre e etc.
Quando ela lê pela primeira vez algo contrário ao que ela
foi ensinada sendo divulgado e corroborado por um coro de mulheres, ela se
espanta. Chega a dizer “essas mulheres são loucas”. Mas conforme o tempo passa,
ela percebe que aquelas mulheres não são tão loucas assim, afinal, sempre achou
sua vida exaustante, sempre reclamou mentalmente da jornada dupla de trabalho e
nunca gostou de escutar cantadas de rua, mas nunca falou, porque achava que por
ser mulher deveria passar por aquilo.
A mulher que conheceu o feminismo na internet e se permitiu
desconstruir junto aos ensinos de outras mulheres sejam elas Simone de Beavouir,
Audre Lorde ou Cora Coralina. Começam a questionar tudo o que lhes foi ensinado
desde pequenas, mas que não foi ensinado, por exemplo, ao seu pai ou seu irmão.
Que as diferenças entre homens e mulheres são apenas fisiológicas e anatômicas,
e em nada lhe diferenciam na hora de desempenhar papéis na sociedade, aos quais
eles insistem em dizer que “existem coisas de homens” e “coisas de mulheres”.
Uma mulher feminista pode ser uma engenheira, uma escritora,
uma advogada, uma pedreira, uma arquiteta, uma médica, astronauta, uma diretora
de empresa e até presidenta de uma nação. Ela não precisa estar ligada em
teorias feministas, mas querer ser “diferente” do que lhe foi imposto na
infância, já a faz uma subversiva.
A feminista que conheceu a militância da internet pode ser
aquela mãe que começa a desconstruir a educação sexista de seus filhos, a
professora que não separa os alunos em meninos e meninas, a tia que não lê
contos de fadas para a sobrinha, porque ela aprendeu que não existe final feliz
com príncipe encantado. Tem a diretora da escola que muda a grade curricular
das crianças, e ao invés de contos de fadas sexistas, ensina mitologia grega e
nórdica. A mulher negra que hoje desfila seus cachos ou mantêm seu Black Power,
como um ato político. A mulher que aprendeu que fazer dietas, além de muitas
vezes não ser saudável, não lhe fazia feliz. Na internet ela aprendeu a amar
suas formas e que ser gorda não é defeito. A jovem garota que vivia em um
relacionamento abusivo, e com as "feministas de internet" recebeu alertas sobre sua situação e
conseguiu se libertar. Dar apoio emocional e psicológico para a amiga que
sofreu violência no relacionamento. Segura a mão e dá o ombro para mulheres que
sofrem por serem mulheres. Dizer á elas que a culpa NÃO É DELAS.
Também tem aquela mulher que sofria disforia e tinha nojo da
própria vagina. Usava cremes, sabonetes e tudo o mais que o mercado lhe
impusera, tudo para camuflar seus odores naturais. Descobre seu corpo, o que
antes era proibido, hoje não é mais. Se depila ou não se depila. Transa ou não
transa. Fica com homens ou com mulheres. É casada e tem filhas. Escreve textos
para mulheres. Ela faz o que sente, vive em paz. São várias mulheres e com uma diversidade
incrível. Mas todas tem algo em comum: sofrem opressão por apenas serem
mulheres. Claro que há o recorte de classe e raça, mas sempre haverá por trás a
opressão de gênero.
Esses são alguns exemplos reais sobre a minha vida, a vida
de minhas amigas e pessoas conhecidas. Pessoas que mudaram suas atitudes e
comportamentos através do "feminismo de internet". Mudaram suas vidas
e até as vidas das pessoas ao seu redor.
Isso não quer dizer que apenas o feminismo é o apontador de
mudanças, isso quer dizer que o feminismo foi o começo da mudança na vida de
muitas mulheres. E que muitas mulheres conheceram o feminismo através da
internet.
As “feministas de internet” aprendem e desconstroem suas
atitudes e comportamentos em seu cotidiano. A desconstrução começa quando a
mulher abre sua mente e permite aprender sobre os dogmas que lhe foram impostos
em sua vida. O empoderamento é coletivo, pois nenhuma mulher se desconstrói
sozinha e sempre, sempre vão estar ensinando as demais. Aprender e ensinar é
algo infinito na militância feminista. Dizer que "feministas de
internet" não contribuem para o
movimento é só mais uma atitude ou fala irresponsável vinda de pessoas que
realmente não contribuem em nada, estão mais preocupadas em vigiar as
“feministas de internet” e criar páginas para ridicularizar e criticá-las.
Ao invés de rotular e estereotipar mulheres (até aqui anda
novo sob o sol) procure algo que lhe interessa. Algo que lhe preencha e
satisfaça. Juro pra você que é bom, é legal.
Não perca o seu tempo julgando mulheres que estão procurando melhorar
suas vidas, seja na internet ou em coletivos presenciais, ou em ambos. Não
importa qual a ferramenta que ela utiliza para desconstruir a reprodução do
machismo e a sua socialização, o importante é que ela faz.
E para vocês, “feministas de internet”, continuem
desconstruindo, militando, gritando e agindo em suas vidas em concordância com
o que escrevem. Mulheres empoderadas estão aí, e esse fato não mudará. A
sociedade pode tentar calar nossa voz nos chamando de loucas ou desocupadas,
mas incomodamos muito mais na vida real. Por que a sociedade já percebeu que o
nosso jeito subversivo veio para ficar e incomodar.
Att,
feminista de internet.
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